domingo, 29 de novembro de 2009

A Metamorfose ou Os Insetos Interiores ou O Processo

Notas de um observador:


Existem milhões de insetos almáticos.
Alguns rastejam, outros poucos correm.
A maioria prefere não se mexer.
Grandes e pequenos.
Redondos e triangulares,
de qualquer forma são todos quadrados.
Ovários, oriundos de variadas raízes radicais.
Ramificações da célula rainha.
Desprovidos de asas,
não voam nem nadam.
Possuem vida, mas não sabem.
Duvidam do corpo,
queimam seus filmes e suas floras.
Para eles, tudo é capaz de ser impossível.
Alimentam-se de nós, nossa paz e ciência.
Regurgitam assuntos e sintomas.
Avoam e bebericam sobre as fezes.
Descansam sobre a carniça,
repousam-se no lodo,
lactobacilos vomitados sonhando espermatozóides que não são.
Assim são os insetos interiores.
A futilidade encarrega-se de maestra-los.
São inóspitos, nocivos, poluentes.
Abusam da própria miséria intelectual,
das mazelas vizinhas, do câncer e da raiva alheia.
O veneno se refugia no espelho do armário.
Antes do sono, o beijo de boa noite.
Antes da insônia, a benção.
Arriscam a partilha do tecido que nunca se dissipa.
A família.
São soníferos, chagas sem curas.
Não reproduzem, são inférteis, infiéis, in(f)vertebrados.
Arrancam as cabeças de suas fêmeas,
Cortam os troncos,
Urinam nos rios e nas somas dos desagravos, greves e desapegos.
Esquecem-se de si.
Pontuam-se
A cria que se crie, a dona que se dane.
Os insetos interiores proliferam-se assim:
Na morte e na merda.
Seus sintomas?
Um calor gélido e ansiado na boca do estômago.
Uma sensação de: o que é mesmo que se passa?
Um certo estado de humilhação conformada o que parece bem vindo e quisto.
É mais fácil aturar a tristeza generalizada
Que romper com as correntes de preguiça e mal dizer.
Silenciam-se no holocausto da subserviência
O organismo não se anima mais.
E assim, animais ou menos assim,
Descompromissados com o próprio rumo.
Desprovidos de caráter e coragem,
Desatentos ao próprio tesouro...caem.
Desacordam todos os dias,
não mensuram suas perdas e imposturas.
Não almejam, não alma, já não mais amor.
Assim são os insetos interiores.

(Teatro Mágico)

partida


Quando ele dobrou a esquina parecia que tudo continuava igual. Eram os mesmos pais deixando os mesmos filhos na escola, os mesmos donos da mercearia abrindo a loja, os mesmos aposentados voltando pra casa os pães frescos da padaria da esquina, as mesmas pessoas passando na rua olhando pro meu pijama de corações, o cabelo bagunçado e as olheiras de quem não dormiu a noite inteira. Era tudo igual. As pessoas continuavam acordando cedo para as caminhadas matinais, o céu continuava nublado e sem formato, o cheiro do café recém saído da chaleira era o mesmo. Nada tinha mudado! As duvidas continuavam passando pela minha cabeça como se fossem únicas e retornavam pelo mesmo caminho travestidas de sensações. Não mudou muita coisa...até ele dobrar a esquina!

domingo, 15 de novembro de 2009

Não choro
Meu segredo é que sou
Rapaz esforçado
Fico parado, calado, quieto
Não corro
Não choro
Não converso
Massacro meu medo
Mascaro minha dor
Já sei sofrer
Não preciso de gente
Que me oriente
Se você me pergunta:
Como vai?
Respondo sempre igual:
Tudo legal
Mas quando você vai embora
Movo meu rosto do espelho
Minha alma chora
Vejo o Rio de Janeiro
Comovo, não saldo, não mudo
Meu sujo olho vermelho
Não fico parado
Não fico calado
Não fico quieto
Corro, choro, converso e tudo mais
Jogo num verso
Intitulado o mal secreto
Não choro
Meu segredo é que sou
Rapaz esforçado
Fico parado, calado, quieto
Não corro
Não choro
Não converso
Massacro meu medo
Mascaro minha dor
Já sei sofrer
Não preciso de gente
Que me oriente
Se você me pergunta:
Como vai?
Respondo sempre igual:
Tudo legal
Mas quando você vai embora
Movo meu rosto do espelho
Minha alma chora
Vejo o Rio de Janeiro
Comovo, não saldo, não mudo
Meu sujo olho vermelho
Não fico parado
Não fico calado
Não fico quieto
Corro, choro, converso e tudo mais
Jogo num verso
Intitulado o mal secreto

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Será que eu te encontro?
















- (...) e se eu fechar os olhos?
- voce não tem medo do escuro?
- as vezes eu te sinto tão perto...
- não percebe que a hora já passou?
- eu acredito no amor a primeira vista!!!
- Cigarro?

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Torquato

"Quando eu escrevo, ou quando eu recito uma palavra, um mundo poluído explode comigo e logo os estilhaços desse corpo, retalhado em lascas de morte e fogo, como napalm, espalham imprevisíveis significados ao redor de mim."
(Torquato Neto)

Who i am?

"Não sei quantas almas tenho
Cada momento mudei
Continuamente me estranho
Nunca me vi nem acabei
De tanto ser, só tenho alma
Quem tem alma não tem calma
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou
Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que sogue não prevendo,
O que passou a esquecer
Noto à margem do que li.
O que julguei que senti.
Releio e digo: "Fui eu?"
Deus sabe, porque o escreveu."

(Fernando Pessoa)

terça-feira, 21 de julho de 2009

À espera.(ou Das vezes em que o desejo reprimia-lhe o pudor!)

De todas as vezes que seu corpo pedia fala, aquele era o mais frustrante. Os olhos ganhavam profundidade infinita demonstrada na pupila, as veias pulsavam pelo sangue que procurava um alento, o corpo suava como se quisesse expelir o desejo reprimido. Ouvia vozes. Sabia que eles estavam ali. Olhava o trinco fixamente, esperando mãos, bocas, dedos, falos. E tinha a certeza de ser ela, naquele momento, um pedaço do mundo ainda não descoberto por completo, mas usufruído em seus poucos e intensos momentos hedônicos. Seria essa a questão que lhe movia? Pensou. Ou algo que ia além dos sentidos. Além de culturas, de valores pessoais. Algo que talvez transcendessem seu pensar, seu agir ou a fisiologia do seu corpo. Corpo fino. Magro. Raquítico, diziam sempre. Mas ela gostava. Eram poucos músculos e isso nunca lhe incomodou. Era mais. Sim, era mais! Os outros não viam. Mas isso não a constrangia. Olhava o trinco fixamente. A espera lhe maltratava. Eram horas olhando para um mesmo ponto. Já chegou a percebê-los perto. Senti-los. Nunca tocá-los. Mas os pelos do corpo se sobressaiam na pele quando os percebia próximo a nuca. Sem toque, sem cheiro. Só o calor. Queria os ali, naquele momento. Entre suor e suspiro. Era amor. Sim. Porque para ela a união de corpos era mais romântica que as juras de amor. Aliás, sempre fugiu das juras de amor. Achavam-nas falsas. Os corpos não. Independente de onde e como fosse, era sempre amor. Naquele momento, na sua intensidade única, eles eram verdadeiros. Pele, unha, carne, ardência, gemido, amor. A comunicação entre os corpos. O discurso das carnes. Olhava o trinco fixamente. E seu corpo ainda pedia fala. Queria imperar exclamações. E afogar gemidos. Ouvia vozes.

TEIMOSIA

Sempre foi teimosa, desde a infância: quando na sala defendia que as meninas podiam sim ir de short pra escola, ou ainda na certeza de que ir para o sitio da amiga poderia fazer bem para toda a família, já que era danada demais e nunca ficaria sem fazer nada num domingo à tarde.

Sempre foi teimosa, até quando decidiu – contra toda a família – namorar um primo legítimo, que morava em sua própria casa e, assim, acabar perdendo a virgindade na mesma cama onde dividia espaço com bonecas e ursos de pelúcia.

Sempre foi teimosa; defendendo sua escolha na área de comunicação, enquanto todos esperavam, sonhavam e torciam pelo seu futuro na advocacia - "a juíza da mamãe!".

Sempre foi teimosa, principalmente quando, ainda adolescente, tomou uma das decisões mais importantes da sua vida até hoje e largou para trás um futuro previsível e uma provável família, de um casamento (in) feliz e (in) completo.

Sempre foi teimosa; o suficiente para arriscar a imagem, o nome, o "caráter", o amor da família, e a paz em um relacionamento de futuro (?) e de deliciosas e imprevisíveis histórias que poderia vir a ter com alguém mais tranqüilo (?), menos ciumento e mais seu (?).

Sempre foi teimosa, tanto que, mesmo com pé- na- bunda, choro no meio do povo, sexo sem compromisso e sem amor (?), insistia em ver ali um sentimento ainda não acabado (?), uma esperança ainda não perdida (?) e uma certeza tão exata quanto a matemática na numerologia.

Sempre foi tão teimosa que, mesmo depois de tantas lágrimas derramadas, tantos pedidos de calma, tantas rezas maternas e noites de exorcismo, resolveu arriscar mais uma vez e colocar seu amor à prova da felicidade tão almejada e idealizada em cada segundo da sua vida de mulher.

Sempre foi teimosa o suficiente para deixar de lado certezas formuladas (?) e acreditar que o que fazia era o melhor para si e para o seu amor, sentimento que, até então, a movia.

Sempre teve tanta teimosia e fé naquilo que acreditava, que lhe formava e que era parte de si, que mesmo diante do que se mostrava claramente não mais como o que sempre foi seu, insistia em ver no escuro a chama de uma vela ou ao menos a faísca de um isqueiro.

Sempre foi tão teimosa; que se tornou cega e, onde não havia mais planos, nem sonhos, nem palavras, nem convergência de sentimentos, nem crença naquilo que já era certo (?)... onde não mais enxergava a foto mais bonita; a camisa com símbolos; o quadro com flores; a música dançada na cama; a primeira noite em um motel; a primeira viagem juntos ou a primeira viagem a sós; os almoços em casa ou na rua; a certeza da eternidade juntos da Maria Clara e do Eduardo...

Sempre foi tão teimosa; que um dia cansou de teimar, nadar contra a maré, sempre morrer na praia e buscar o pote de ouro do fim do arco-íris. Mas ela não pode dizer que não valeu à pena. Valeram à pena muitas das coisas que viveu – porque foram intensas e viraram belas histórias.
E a teimosia? Bom, ficaram então, ela e a teimosia dela, guardadas; dando espaço pra outras teimosias, outras duvidas, outras histórias...

domingo, 14 de junho de 2009

Todas e mais algumas, como posso e como sei!

“Rosa Rocha”

Da força na mente e nos braços
Da coragem de seguir adiante
Da genética que não se cansa em aparecer
Do orgulho do canudo e dos diplomas
Da mistura de liberdade e prisão
Da verdade em pensar, falar e escrever
Do sonho que é vivido todos os dias

"Rosa”
Dos traços no olhar torto
Da vista de baixo
Do sorriso sincero
Da boa vontade de ser
Das palavras verdadeiras
Das brincadeiras sem graça
Do anseio em se mostrar
Do não-medo de viver

"Dite”
Da saudade diária
Das revistas em quadrinhos
Do Rambo, Braddock e Rock com biscoito cream cracker no chão do quarto
Da semelhança irritante
Das brincadeiras no chão da sala
Das brigas pelo contraste visível
Do cuidado e zelo únicos
Do aprendizado no silêncio
Do orgulho nas palavras
Da falta do barulho na cozinha, do café quente e do cuzcuz “unido”

“Rosita”
Do jeito desastrado de ser
Da resposta no olhar
Da dúvida na certeza
Do abraço verdadeiro
Do carinho ímpar
Do “pro que der e vier”
Do “quando vai, vai mesmo!”
Da resposta única
Dos porres nos dias de semana
Da sobriedade nos fins de semana

“Flor”
Do olhar direto
Do abraço quente
Das pernas fortes
Do choro e grito
Das costas nuas
Das mãos marcadas
Da decisão tomada
Do sim na praia

“Metade”
Das histórias juntas
Dos choros consolados
Dos sorrisos trocados
Do pensamento contínuo
Do amor incondicional
Da saudade compartilhada
Da certeza do amor correspondido

domingo, 10 de maio de 2009